Janilson Sales de Carvalho
Caminhando numa bela
manhã de abril de 2016 na Praia dos Ingleses, em Florianópolis/SC, encontrei
uma imagem de Iemanjá semelhante a que existe na Praia do Meio no litoral de Natal/RN.
Ela é bem menor e não está instalada na areia da praia, ficando próxima ao casario.
Também não está de costas para o mar como se dele saísse. Pelo contrário, é
como se olhasse o mar recebendo os homens que regressam. Aos seus pés, velas
acesas.
A praia catarinense é
ainda de pescadores. Essas pequenas diferenças nas duas imagens me remeteram a
um texto escrito pelo escritor paulista João Antônio, onde ele cita que “os
trabalhadores das águas têm dois amores, um bem da terra e um bem do mar”. As
posições das duas imagens indicam que a rainha está nesses lugares protegendo a
partida e a chegada. Um amor eterno e zeloso. Além de referir-se a esse bem
protetor, o escritor também define e descreve a rainha das águas nas suas
diversas representações na cultura humana através dos séculos. Eis o texto:
As suas cores são o
azul e o branco. Ela é vaidosa, sobrepaira, sereia, tem muitos nomes, um mais
bonito que o outro, manhosa, cismada, caprichosa e prefere que a presenteiam
com flores, dengos, vidrilhos, pentes, broches, perfumes, doces, brincos,
espelhos, revistas femininas e coloridas, joias, bonecas, mimos, brinquedos. E
que a salvem: “Odoiá, Iemanjá!”. É também Janaína, dona Janaína, Marabô,
Oloxum, Inaê, Princesa do Aioká, Dandalunda, Mãe D’Água, Sereia Mukunã...Tem
poderes. Fecha ou abre o mar para os saveiros e para as jangadas e os trabalhadores das águas têm dois amores,
um bem da terra e um bem do mar. O bem da terra é uma , a que fica na beira da
praia quando o pescador sai e parte. O bem do mar é o mar que, acho, não tem começo nem fim o
mar e os mares, acabam onde os meus, os teus olhos e olhos nenhum alcançam, é
tudo bonito. E é feio, o mar; brabo, mete medo.
(A um palmo acima dos joelhos – João Antônio)
O reino das águas é
enigmático. Os trabalhadores do mar vivem uma aventura diária. A imensidão dos
oceanos conduz todas as grandes narrativas humanas. A “conversa de pescador” é
algo que sempre nos lança no imaginário fantástico. Nós, nas nossas salinhas
com celulares nas mãos, jamais sentiremos a força das águas profundas ou das
ondas gigantes. Também não entenderemos a força sagrada que emana da Rainha do
Mar. No máximo, recorremos ao ritual de ano novo apelando para um banho que nos
limpe das mazelas do passado.
Os povos do mar sabem
muitos segredos e, baseando-se neles, Jorge Amado nos proporcionou belas histórias
nos seus livros. Muitas ainda não foram contadas em textos, porém, diariamente,
são relatadas em cada beira de praia onde residem pescadores. Só eles podem
falar da bela mulher vestida de azul e branco que fecha ou abre o mar para
saveiros e jangadas. “Odoiá, Iemanjá!”
Parabéns, Janilson, pelos belos textos, seu e do João Antônio. Amei!
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